Fonte: http://gameworld.com.br/8534-nao-ha-motivos-para-se-decepcionar-com-o-xbox-oneNão concordo com algumas coisas, mas muitas outras fazem sentido. Acho válido trazer algumas matérias menos pessimistas para o PXB.Não há motivos para se decepcionar com o Xbox One Quem não assistiu a conferência que apresentou o Xbox One e correu direto pros principais sites e portais especializados provavelmente achou que a Microsoft soltou rojão na cara de crianças ao vivo. Os adjetivos mais leves sobre a apresentação foram "decepção", "fracasso", "descontentamento" e "sucessivos erros". Parecia o fim do mundo, parecia que a Microsoft misturou as mancadas de apresentação de console - o preço absurdo do PS3, a indecisão da Nintendo em mostrar as funções do Wii U - e piorou tudo de forma irreversível. Adeus Xbox, vocês desaprenderam como se faz! Toda a pompa e o glamour estava lá, mas não passou uma casca vazia para quem curte jogos. Uma das chamadas-símbolo dessa frustração veio do Gamasutra, com um nível patético de arrogância: "Gamasutra editor-at-large Leigh Alexander wasn't particularly impressed with today's "groundbreaking" Xbox One unveiling" (Editora do Gamasutra, Leigh Alexander, não ficou particularmente impressionada com a apresentação 'inovadora' do Xbox One hoje). O Kotaku seguiu a mesma linha, com um pouco menos de idiossincrasia: "That Xbox One Reveal Sure Was A Disaster, Huh?". E o que se seguiu foi ainda pior, como um grupo de lagartos que veem uma mancha de calor à frente e terminam entrando numa fogueira, seguindo o resto da tropa. Comportamento similar vimos quando os primeiros reviews de Aliens: Colonial Marines, após as primeiras notas desastrosas, teve jornalista que admitiu jogar apenas duas horas antes de mandar uma nota zero. Poucos esperaram a emoção baixar e depois escreveram alguma coisa apurada. A carga decepcionante da apresentação foi reunida num vídeo que provavelmente fez até o próprio Don Mattrick soltar algumas risadas: O primeiro ponto sobre o assunto é a falta de leitura dos planos da Microsoft. Se um jornalista foi até Redmond e esperou ver uma infinidade de games matadores, franquias novas e explicações de como games são arte, ele se encaixa somente em duas situações: ou ele é novato ou não fez o serviço dele direito pelo menos nos últimos dois anos - para não dizer desde 2001, quando Bill Gates já chamava o Xbox de "central de entretenimento". A Microsoft no ramo de entretenimento não age tradicionalmente, como Nintendo e a Sony. A empresa é vista como um dinossauro gigantesco, que passa, pisa, bagunça tudo, e não consegue acertos cirúrgicos. É sustentada principalmente pelo mercado bilionário do Office e tem grana em caixa suficiente para bancar aventuras "menores" como o Xbox. Ela também é lenta. Demorou pra sacar o potencial do mercado de busca e quando abriu os olhos o Google já era imbatível. Demorou pra investir em sistemas mobile e deixou o Android e iOS brigarem praticamente sozinhos. No ramo de touchscreen praticamente só entrou agora, com o Windows 8 e o Surface. Também entrou atrasado no mercado de games, muito porque o potencial mercadológico do Windows pode ser aos poucos minado por uma nova realidade que envolve apps e serviços. Esse futuro visto pela Microsoft é similar ao da Apple - centralizador, conveniente para clientes com perfil americano-bebedor-de-Budweiser e imensamente lucrativo para a empresa. Não faz sentido que os jornalistas não encarem a proposta da Microsoft para o Xbox One (e todos os outros que vierem após) como uma extensão da estratégia global da empresa. Qualquer um com o mínimo de preocupação em entender os planos da empresa, que viu pelo menos a última E3 ou eventos similares, não saiu decepcionado. Era simplesmente a continuação de um plano mais longo. A Leigh Alexander, no Gamasutra escreveu: "No entanto, até o final do evento do console, eu me mantive desorientada, sentindo como se eu tivesse visto uma das Big Three [termo para as três principais montadoras automobilísticas americanas: Ford, General Motors e Chrysler] (...)". A Leigh ainda fala de "um mundo fictício onde todos possuem televisões enormes, se entretêm com simulações de futebol de última geração, (...) onde salas de TV são gigantes". Pois é exatamente esse o futuro que a Microsoft enxerga não agora, mas pra daqui a cinco anos. Não no mundo todo, mas nos Estados Unidos, os compradores mais ávidos das caixas da empresa. Quando o Xbox 360 foi lançado com suporte a 720p, muitos acharam risível, para logo ver o quanto a resolução é obrigatória há pelo menos três anos.Qualquer um que olhar os gráficos de vendas de console segmentado por continentes vai entender que essa aposta é vencedora. Xbox 360 e PlayStation podem estar exatamente empatados nos gráficos globais de venda de consoles, mas os números reunidos não mostram as sutilezas envolvendo cada continente. A Microsoft domina o mercado americano, onde o Xbox 360 vendeu quase a mesma quantidade que o Wii - 44,7 milhões pro console da Nintendo e 43,9 milhões pro da Microsoft, enquanto o PS3 possui 26,6 milhões [dados do VGChartz]. Na Europa e no Japão, o domínio é da Sony (ou da Nintendo, depende de como quiser analisar). O problema envolvido não é só o efeito dominó por trás das sucessivas matérias, notícias e artigos que não pouparam esforços para detonar a apresentação da Microsoft, mas sim a falta de entendimento dos jornalistas de mercado e de cultura corporativista - e da própria natureza atual dos grandes eventos e anúncios. Consoles são produtos mercadológicos, cuidadosamente criados para consolidar uma filosofia da empresa, que aposta em um pensamento que deve perdurar por pelo menos cinco anos - na atual geração sete, na próximo chuto dez. Não digo que a posição da Microsoft é a correta, mas a imprensa especializada precisa ver um pouco além do "cadê os games? É isso que importa!". Com uma análise clara da estratégia corporativa da empresa é possível evitar qualquer decepção, pois não se formaram grandes expectativas. Eu não criei grandes expectativas sobre a apresentação do Xbox One, e por isso achei a apresentação até boa. Ademais, como ressaltou a Kill Screen, a imprensa que analisa games é a única que se auto-exige essa análise completa. Jornalistas de música não fazem reviews do iPod ou precisam entender que tipo de estratégia mercadológica está inserida ali. O mesmo para críticos de cinema, que não analisam DVDs concorrentes e às vezes nem mesmo diferenças entre projeções 3D. Isso geralmente é a área de jornalistas de tecnologia, ou mesmo de revistas segmentadas para o mercado.Mas jornalistas de games obrigam-se - e também são obrigados pela direção editorial de seus veículos - a terem uma visão mais ampla, também pelo fato do mercado de games ter um funcionamento um pouco diferente dos outros: comprar um console é se inserir numa filosofia e em um plano corporativo global. E esse é um investimento caro, de forma que para muitos, um erro é permanente. Então, se nós jornalistas quisermos analisar corretamente o Xbox One, não temos que compara-lo unicamente com o PS4 (ou o Wii U, se você estiver disposto), mas com set-top-box, Apple TV e outra gama de dispositivos que brigam pelo campo de batalha das salas de estar. É o objetivo da Microsoft e é reducionista não levar isso em conta, inclusive na hora de tirar as impressões do evento - é o mesmo que querer rir num filme de drama, é querer que a empresa atenda suas expectativas. A Wired, falando justamente sobre essa questão, afirmou que os "gamers hardcore desejam o impossível", com o argumento de que empresas que só fabricam dispositivos de games (Nintendo e Sony) estão com sérias dificuldades financeiras. É um bom ponto, mas também parece incompleto por analisar unicamente lucros de divisões de entretenimento.Uma olhada fria em gráficos revela a Microsoft chutando as concorrentes de forma arrasadora e lucros muito minguados da Sony. Bingo, xeque-mate, essa história de consoles unicamente para games está absolutamente errada desde sua concepção! Não tão rápido! A análise dos gráficos não mostra os erros da Sony com preços, lançamentos atrasados, gastos excessivos com um processador que simplesmente não decolou, etc. Me parece igualmente correto olhar a recuperação da Sony - não somente no sentido que toda a fabricante de console toma prejuízo nos seus dois primeiros anos - mas porque a empresa enfrentou pesadas reformas estruturais, que provavelmente começarão a dar frutos nos próximos três anos. Apesar dessa diferença abissal de estratégias, nunca em outra geração tivemos consoles tão parecidos: arquiteturas iguais, datas de lançamento coladas (novembro, aposto), mídias iguais, third-parties de peso trabalhando pros dois lados, e por aí vai. Quem sai vivo desse ringue? As duas, aguarde um novo empate, mas espere um distanciamento ainda maior entre elas. A Sony tem rede online com mais games, e melhores estúdios internos, e a Microsoft tem serviços.Mas o diabo está nos detalhes: desde 2009 (justamente quando essa ruptura começou a ficar mais clara para todos) a Sony vende pelo menos 700 mil PS3 a mais que a Microsoft vende X360. Em 2009 a diferença foi mais gritante: quase 3 milhões de consoles [VGChartz de novo]. Se a nova geração herdará alguma coisa da atual, é provavelmente dessa reta final. Consoles já possuem formas de "prenderem" seus consumidores, e ela se chama rede online. A PSN Plus se tornou quase um objeto de culto pela oferta vastíssima de games grátis, o que parece muito mais vantagem do que a Gold, que cobra pelo que deveria ser de graça - multiplayer, usar o Netflix. Todos esses detalhes devem se refletir na próxima geração. Mas é preciso entender de economia pra entender se tudo isso é lucrativo o bastante para uma gigante como a Sony, que está sangrando dinheiro e num momento muito mais dramático que a Microsoft, que possui reservas bilionárias. O PS4 definitivamente será o console para o gamer hardcore, mas o Xbox One tentará se firmar como um aparelho "para todos", um PC mais amigável e light. Para saber qual dos dois vencerá, só vivendo mais uma década pra poder ver.