Depois de terminar o jogo, eu acho que consigo entender o porquê de uma parte da galera ter ficado pistola por conta da direção que a história tomou. Mas The Last of Us Part II me pareceu aquele caso onde um diretor faz um filme, a galera entende tudo errado e precisa fazer uma segunda parte, mais escancarada, pra que talvez percebam o que, de fato está acontecendo. The Last of Us não é uma história com final feliz e, apesar de sermos induzidos a acreditar nisso, pois é bastante comum em videogames, nós não somos o herói da história. Joel não é um herói, mas um cara que cansou de sofrer e que foi até as últimas consequências pra diminuir o seu sofrimento. No primeiro jogo, em questão de minutos, ele perde a Sarah; em horas, a Tess. Pra não perder mais ninguém, ele fez o que fez, deixando um rastro de destruição e mortes pelo caminho. Tanto que no final do primeiro, acontece o catalisador de tudo o que se desenrolou na sequência: quando ele pega a Ellie no hospital, não precisava matar o médico, podia atirar na perna, sei lá, mas o jogo obrigatoriamente exigia que pegássemos o bisturi e enfiássemos no pescoço dele. Os outros dois ajudantes podiam sair vivos, se assim a gente quisesse.
O que acontece na parte II é resultado de tudo isso aí. Se o Joel não tivesse matado o pai da Abby, talvez esse jogo não precisasse existir. Mas ele matou e derrubou o primeiro dominó de uma série de eventos, e a Naughty Dog fez um trabalho muito bom ao mostrar que os "vilões" da história eram, na real, pessoas - algumas, muito legais, que só queriam viver a sua vida também. Pessoas, talvez, até melhores do que Joel e Ellie, mas ao mesmo tempo, muito parecidas. A cena do Joel e Ellie no museu, um dos pontos altos do jogo, inclusive, tem seu paralelo com Abby e Jerrie naquele parque, onde eles salvam a zebra (o jogo inteiro, aliás, tem muitos paralelos entre Joel/Ellie e Jerrie/Abby). A Abby matou o Joel, sim, pesado, mas justificável pela dor que ele causou pra ela, só que o sentimento de vingança dela acabava ali, ela poderia ter dado um fim a Ellie e ao Tommy, mas permitiu que os dois saíssem livres de tudo isso, porque o Tommy nem estava junto no hospital e a Ellie era uma criança que não decidiu nada, só assistiu.
E a morte do Joel representa um baque muito forte pra Ellie, porque ela ficou anos e anos remoendo aquele momento em que ela acorda no banco de trás da camionete, ou aquela conversa final do primeiro jogo. Nós passamos por vários questionamentos dela nos flashbacks, inclusive. Anos e anos tentando superar uma dor e, quando eles conseguiram encontrar a frequência certa novamente, a mesma sintonia naquela última conversa (cada um do seu jeito), o passado vem cobrar seu preço e tira Joel da Ellie. A única pessoa que não a abandonou não estava mais ali - e isso se mostra verdade quando vemos, no final do jogo, que até a Dina, que passou por poucas e boas ao lado da Ellie, que aguentou horrores pra ficarem juntas, também foi embora. Como ela mesma disse naquela última cena das duas na casa, não é que não fosse difícil, mas pela Ellie e pelo gurizinho, ela aguentava.
Na outra ponta, vem o trabalho magistral dos roteiristas de fazerem a gente se importar com a Abby. Ela perdeu muito mais do que a Ellie. Se tinha alguém nessa história com motivos pra estar com raiva e arregaçar tudo pra sair matando geral, era a Abby: perdeu o pai, perdeu amigos próximos, perdeu o cachorro, tudo pelas mãos de Joel (pai) e Ellie (o resto). Perdeu até os companheiros de WLF também. E parte dela, não da Ellie, uma proposta de trégua na praia. A Abby só decide brigar quando a Ellie ameaça o Lev - e, aqui, salta aos olhos o quão parecidas são as relações das duas duplas durante os jogos. Dois desconhecidos unidos pelo acaso e que, ao longo do tempo, foram virando amigos e criando uma relação tão forte, capaz de tudo pra proteger quem amam. A Abby carregando o Lev para o barco é exatamente a mesma coisa do Joel carregando a Ellie do hospital.
A diferença abismal entre Abby e Ellie é que a primeira quer recomeçar, enquanto a segunda não consegue recomeçar. Ela quer vingança, ela precisa de vingança, pois foi a única coisa que restou pra ela. E, no final, nem isso ela teve. Terminou sem o Joel, morto; sem a Dina, seu grande amor; sem amigos que fez pelo caminho, seja porque eles morreram, seja porque se afastaram; sem uma comunidade da qual fazia parte; terminou, até, sem dois dedos - e pode parecer bobo, mas a perda dos dedos representa, também, a perda final do Joel, o corte no último fiozinho da relação que eles tinham. Quando a Ellie volta pro rancho e vê a casa vazia, ela encontra o violão e começa a tocar a música que o Joel toca pra ela, mas, sem dois dedos, ela não consegue fazer todos os acordes direito. Ela não consegue mais se conectar a ele, não é mais melodia, tem um ruído grande, uma marca que não pode mais ser corrigida. Ali, ela vira "o último de nós", o último elemento de uma relação que não era somente entre eles dois. E, pra sempre, vai ter que conviver com a culpa de ter deixado tudo isso escalonar pra esse nível.
Da parte técnica, é o trabalho mais impressionante que eu já vi. Mesmo rodando em um PS4 base, aquilo ali funcionar sem travamentos é um feito enorme. Vi um monte de gente compartilhando gifs e vídeos de bugs, personagens caindo pelo cenário, cavalo rodopiando e tal, mas felizmente, aqui não aconteceu nada. Qualidade gráfica, direção de arte, trilha sonora, animações, enquadramentos, simbolismos. Não tem ponto sem nó aqui.
Quando The Last of Us terminou, eu pensei que uma sequência não fosse necessária. Jogando The Last of Us Part II, percebi que ainda existiam coisas que precisavam ser contadas. E ficam os ensinamentos, sem ordem de importância, mas igualmente importantes:
Que jogo espetacular.
O que acontece na parte II é resultado de tudo isso aí. Se o Joel não tivesse matado o pai da Abby, talvez esse jogo não precisasse existir. Mas ele matou e derrubou o primeiro dominó de uma série de eventos, e a Naughty Dog fez um trabalho muito bom ao mostrar que os "vilões" da história eram, na real, pessoas - algumas, muito legais, que só queriam viver a sua vida também. Pessoas, talvez, até melhores do que Joel e Ellie, mas ao mesmo tempo, muito parecidas. A cena do Joel e Ellie no museu, um dos pontos altos do jogo, inclusive, tem seu paralelo com Abby e Jerrie naquele parque, onde eles salvam a zebra (o jogo inteiro, aliás, tem muitos paralelos entre Joel/Ellie e Jerrie/Abby). A Abby matou o Joel, sim, pesado, mas justificável pela dor que ele causou pra ela, só que o sentimento de vingança dela acabava ali, ela poderia ter dado um fim a Ellie e ao Tommy, mas permitiu que os dois saíssem livres de tudo isso, porque o Tommy nem estava junto no hospital e a Ellie era uma criança que não decidiu nada, só assistiu.
E a morte do Joel representa um baque muito forte pra Ellie, porque ela ficou anos e anos remoendo aquele momento em que ela acorda no banco de trás da camionete, ou aquela conversa final do primeiro jogo. Nós passamos por vários questionamentos dela nos flashbacks, inclusive. Anos e anos tentando superar uma dor e, quando eles conseguiram encontrar a frequência certa novamente, a mesma sintonia naquela última conversa (cada um do seu jeito), o passado vem cobrar seu preço e tira Joel da Ellie. A única pessoa que não a abandonou não estava mais ali - e isso se mostra verdade quando vemos, no final do jogo, que até a Dina, que passou por poucas e boas ao lado da Ellie, que aguentou horrores pra ficarem juntas, também foi embora. Como ela mesma disse naquela última cena das duas na casa, não é que não fosse difícil, mas pela Ellie e pelo gurizinho, ela aguentava.
Na outra ponta, vem o trabalho magistral dos roteiristas de fazerem a gente se importar com a Abby. Ela perdeu muito mais do que a Ellie. Se tinha alguém nessa história com motivos pra estar com raiva e arregaçar tudo pra sair matando geral, era a Abby: perdeu o pai, perdeu amigos próximos, perdeu o cachorro, tudo pelas mãos de Joel (pai) e Ellie (o resto). Perdeu até os companheiros de WLF também. E parte dela, não da Ellie, uma proposta de trégua na praia. A Abby só decide brigar quando a Ellie ameaça o Lev - e, aqui, salta aos olhos o quão parecidas são as relações das duas duplas durante os jogos. Dois desconhecidos unidos pelo acaso e que, ao longo do tempo, foram virando amigos e criando uma relação tão forte, capaz de tudo pra proteger quem amam. A Abby carregando o Lev para o barco é exatamente a mesma coisa do Joel carregando a Ellie do hospital.
A diferença abismal entre Abby e Ellie é que a primeira quer recomeçar, enquanto a segunda não consegue recomeçar. Ela quer vingança, ela precisa de vingança, pois foi a única coisa que restou pra ela. E, no final, nem isso ela teve. Terminou sem o Joel, morto; sem a Dina, seu grande amor; sem amigos que fez pelo caminho, seja porque eles morreram, seja porque se afastaram; sem uma comunidade da qual fazia parte; terminou, até, sem dois dedos - e pode parecer bobo, mas a perda dos dedos representa, também, a perda final do Joel, o corte no último fiozinho da relação que eles tinham. Quando a Ellie volta pro rancho e vê a casa vazia, ela encontra o violão e começa a tocar a música que o Joel toca pra ela, mas, sem dois dedos, ela não consegue fazer todos os acordes direito. Ela não consegue mais se conectar a ele, não é mais melodia, tem um ruído grande, uma marca que não pode mais ser corrigida. Ali, ela vira "o último de nós", o último elemento de uma relação que não era somente entre eles dois. E, pra sempre, vai ter que conviver com a culpa de ter deixado tudo isso escalonar pra esse nível.
Da parte técnica, é o trabalho mais impressionante que eu já vi. Mesmo rodando em um PS4 base, aquilo ali funcionar sem travamentos é um feito enorme. Vi um monte de gente compartilhando gifs e vídeos de bugs, personagens caindo pelo cenário, cavalo rodopiando e tal, mas felizmente, aqui não aconteceu nada. Qualidade gráfica, direção de arte, trilha sonora, animações, enquadramentos, simbolismos. Não tem ponto sem nó aqui.
Quando The Last of Us terminou, eu pensei que uma sequência não fosse necessária. Jogando The Last of Us Part II, percebi que ainda existiam coisas que precisavam ser contadas. E ficam os ensinamentos, sem ordem de importância, mas igualmente importantes:
- Tudo o que vai, volta;
- Do outro lado, existe uma história também;
- Uma obsessão pode nos fazer perder tudo aquilo que mais amamos;
- É preciso muita, mas muita coragem pra seguir em frente e deixar o passado para trás.
Que jogo espetacular.
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